(TEXTO FICTÍCIO)
Talvez essa
seja a minha última semana nesse lugar. O ar condicionado parece ficar mais
frio a cada dia. As paredes brancas e sinalizadas com placas de silêncio deixam
o ambiente ainda mais gélido. Essa maca com lençóis brancos faz barulho cada
vez que me mexo, mas já deixou de ser desconfortável. Creio que me acostumei,
afinal, estou aqui no hospital há 8 meses. A comida já não tem um gosto ruim.
Na janta sempre recebemos uma sopa aguada e com pouquíssimo sal, tão pouco que
nem parece tê-lo.
Quando eu tenho melhoras, peço minha irmã
para me ajudar a ir ao lado de fora, pois gosto de sentir ar fresco. Há um belo jardim com
margaridas brancas e amarelas, com algumas flores vermelhas também, que não
tenho ideia de qual espécie seja. Eu gosto dessa combinação. É simples, singela
e confortável. Só de conseguir sair daquele quarto e ver as flores, sentir um
pouco de raios solares na minha pele, já se torna tudo agradável. Talvez essa
seja a última semana que verei tudo isso, tenho que aproveitar.
Normalmente no pátio ficam outras pessoas
com a mesma condição que a minha. Algumas melhores, outras piores. No começo eu
me assustava, mas hoje, eu nem sequer ligo. Aliás, já fiz amizades por aqui.
Algumas já se foram, algumas permanecem e outras continuarão aqui depois que
acabar os meus dias.
Um pouco depois da entrada do hospital tem
a sala do Noah, o médico que cuida de mim desde que vim parar aqui. Alto, com
cabelos negros, barba fechada e sempre aparada. Tem um corpo bem definido, mãos
grandes e fortes, porém suaves. Seu toque é sempre macio. Eu gosto de quando
ele vem me examinar todas as tardes. É gostoso sentir mãos quentes em mim, há
tempos eu não sei o que é estar quente. Pessoas doentes normalmente são frias,
o pouco de calor que nosso corpo tem é para manter nosso coração batendo, mesmo
que vagarosamente.
Mas não, ele não faz meu tipo mesmo sendo
tão bonito. O Ren faz. Ele é dois anos mais velho do que eu. Alto também, mas
ao contrário do Dr Noah, seu corpo não é nada definido. Não há curvas generosas,
nem braços fortes e rígidos. Ele é magro, cintura fina, ombros largos e
aconchegantes. Tem olhos castanhos e brilhantes, boca carnuda e um sorriso....
Ah, que belo sorriso! Quando ele sorri, tudo ao redor fica feliz. Eu fico
feliz...
Tem um pouco mais de uma semana que não o
vejo, a não ser em meus sonhos. Conversávamos quase todos os dias, sempre
tínhamos assunto. Ele foi a pessoa mais marcante para mim durante todos esses meses
internada. Lembro da nossa última conversa, nela eu perguntei o que ele
pretendia fazer depois que saísse daqui.
– Eu tenho um sonho, você faz parte dele. Falamos
disso amanhã, ok? – Ele então me deu um beijo na testa e saiu do meu quarto com
um sorriso enorme, de orelha a orelha, mas no fundo algo o incomodava. Ele não
queria que eu percebesse que estava mal.
Uma hora e 5 minutos depois chegara a
notícia. Eu não podia acreditar, fiquei sem chão. Eu não conseguia parar de
chorar, havia um desespero enorme dentro de mim e acabei não aguentando,
desmaiei. Acordei algumas horas depois na sala de emergência, deitada, fraca, respirando
oxigênio através de uma máscara e algumas agulhas cravadas no meu braço, de
novo. Minha irmã estava no canto do quarto enquanto minha mãe andava na direção
da porta conversando com o Noah.
– O coração dela está cada vez mais fraco,
não creio que haverá tempo até o transplante. Seu nome é um dos últimos na
fila... –Eu escutava isso, enquanto via minha irmã chorar e minha mãe ficar
cada vez mais triste, afinal, ela sabe o que está para acontecer. Até já me
convenci disso.
No dia seguinte, lá estava eu, com um vestido
preto que a mamãe comprou para mim, de pé em frente ao corpo da pessoa que eu
mais me apeguei e que estava apaixonada. Cheguei mais perto e peguei sua mão.
Magra e ainda mais fria que de costume. Pálida e com aspecto roxeado. Não é a
primeira vez que vejo um cadáver. Nesses oito meses vividos em meio a pessoas
doentes, participei de alguns funerais. São todos bem parecidos, não muda muita
coisa.
Hoje, alguns dias depois do ocorrido, ainda
me sinto triste. Sinto falta dele, sinto falta de poder desabafar e conversar
sobre coisas que eu não falava com outras pessoas, nem com o médico. Dentro de
mim sinto que está acabando meu tempo, minha família também já percebeu isso.
Mas eu estou bem, acredite. Não sei o que há após o fim de nossa vida material,
mas espero que eu esteja indo para um lugar melhor, mais confortável, onde eu
não sinta tanta dor física.
Nunca tive a oportunidade de brincar como
crianças normais, ir a baile de formatura, dançar ou nadar. Nadar era meu
sonho, a primeira e única vez que fiz isso não ocorreu nada bem. Na minha
adolescência também não tive o gosto (ou desgosto) de sair com amigos para
algum lugar e beber algo, ou virar a noite na casa de um amigo, ter
experiências amorosas e carnais.... Não, isso nunca me aconteceu. Nunca pude
ter uma vida normal como de qualquer outra pessoa. Grande parte da minha vida
foi perdida ficando internada em hospitais. Agora, aos 21 anos, só quero que
isso acabe logo.
Não estou desejando meu fim, só estou sendo
sincera comigo mesma, pois eu sei que ele está próximo. Já me despedi de quem
eu deveria me despedir, já agradeci a quem eu deveria agradecer. Me apaixonei
por quem eu deveria me apaixonar e agora, estou terminando minha vida como ela
deve ser terminada. Ainda há uma última coisa a se fazer, mas creio que isso seja um segredo.
Viva a vida até seu último minuto da forma
que ela deve ser vivida. Faça o que tem de ser feito, ame mesmo que acima de
tudo. Acredito que em breve nos veremos num lugar bem melhor.
Que lindo texto! Adorei conhecer a forma como você escreve e preciso dizer: continue! Quero ler sempre mais e mais de você <3
ResponderExcluirSorria sempre :)
Obrigada Malu! <3
ExcluirE pensar que essa história é mais comum do que a gente imagina... Que conto lindo. Me deu saudades de escrever esse tio de texto tbm.
ResponderExcluirSuper beijos,
Missmoon | BLOG & STORE - Por Neila Bahia
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Sim, é bem comum mesmo. Obrigada Neila! <3
ExcluirOlá, tudo bem? Amei o seu texto, que história linda! Com certeza a melhor frase é: "Viva a vida até seu último minuto da forma que ela deve ser vivida" conheço muitas pessoas que vivem a vida dos outros e esquecem da sua própria vida.
ResponderExcluirVocê escreve no wattpad? gostei do texto, você tem futuro como escritora!
Beijos e abraços
http://resenhasdaviviane.blogspot.com.br/
Obrigada Viviane, não conheço o wattpad, já vou procurar saber. <3
ExcluirNossa! que texto... que história linda, eu amei o seu texto!
ResponderExcluirFoi você que escreveu? No wattpad? Manda link pra gente ler, eu gostei, achei interessante a história e o ultimo paragrafo, eu concordo com o que você disse! Não sabemos oque o amanhã espera de nós, temos que aproveitar e saber viver a vida cada segundos, momentos...
Bjs
https://holanda-physicaleducation.blogspot.com.br
Obrigada Holanda! haha Então não sabia nem o que era wattpad, acabei de procurar aqui. Não escrevo em nenhum lugar sem ser aqui no Notivagar. Basta seguir aqui que sempre terá uns textos meus flutuando em algum lugar! <3
ExcluirQue texto lindo, me emocionei.
ResponderExcluirFoi você que escreveu? Se sim, devo parabeniza-la, por escrever um texto triste, mas com muita doçura.
Beijos
camilaporai.com.br
Obrigada Camila! <3
ExcluirFui eu sim que o escreveu. xD
Simplesmente incrível a forma como você se expressa. Gostei muito mesmo do texto.
ResponderExcluirParabéns.
Obrigada Paula! <3
ExcluirCaramba! que post/texto tocante ♥
ResponderExcluirIrei te acompanhar pra ler mais postagens lindas como essa. Você escreve muito bem
Obrigada Sam Joyce <3
ExcluirAcompanha sim que de vez em quando eu escreverei algo. xD
Lindo seu texto e de uma sutilidade incrível. Você trouxe um assunto que de certa forma muitas pessoas acham pesado e conseguiu passar a mensagem lindamente de forma simples e delicada. Continue com seus textos, são ótimos.
ResponderExcluirObrigada Helô! <3 Foi um pouquinho complicado escrevê-lo, mas por fim eu consegui. xD
ExcluirLinda história, é desesperadora, triste, realista e fascinante ao mesmo tempo.
ResponderExcluirBites!
Tary Belmont
Obrigada Tary! <3
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